sábado, 19 de fevereiro de 2011

A imagem da Disney e a globalização do entretenimento

Há tempos as empresas com atuação global vêm percebendo, às vezes até sem muito jeito, que cultura não se enfia “goela abaixo”, principalmente nos países emergentes. No passado, personagens como Mickey Mouse, Pateta, Tio Patinhas ou Pato Donald povoavam a mente de crianças no Brasil e no mundo, com suas peripécias fundadas numa cultura colonialista norte-americana que nada tinha a ver com a realidade destes países.


Mas como disse sabiamente o poeta, “nossos heróis morreram de overdose”.

Em matéria divulgada pelo Portal Exame em maio de 2008, a Disney, assim como todas as grandes empresas globais, passou a dar maior atenção aos mercados emergentes. Seu principal executivo, Robert Iger já declarou algumas vezes que é preciso equilibrar investimentos entre os mercados mais maduros e países como Rússia, Índia, China e Brasil.

Neste rumo, a Disney tem apostado na criação e na adaptação de séries e filmes para mercados regionais, produzidas em parceria com produtoras locais. Exemplos como as versões da série High School Musical

são preparadas no México, Argentina e Brasil.

Mas mais do que isto, a interpretação da cultura local, do modo de vida das populações, costumes, ritos, imaginário popular e, principalmente, heróis locais têm favorecido o surgimento de novos filmes. A Disney conquistou a China com um filme sobre uma abóbora (The Magic Gourd – A Abóbora Mágica), baseado em um conto chinês e falado em mandarim. Este filme chinês é o exemplo mais bem acabado do esforço da Disney para expandir suas fronteiras e, ao mesmo tempo, trocar sua filosofia de colaboração com a imposição da cultura norte-americana pelos lucros aos seus acionistas.


Aliás, durante as últimas 3 três décadas, os tentáculos das grandes empresas americanas têm mostrado certa fragilidade, reflexo do fim da guerra fria (antes era preciso estar deste ou daquele lado da política), do desenvolvimento acelerado e da democratização das comunicações, bem como da emancipação econômica e algumas vezes, política dos países do BRIC, além de outros menos populosos.


Garantir uma imagem de empresa séria e honesta, com missão e valores a serem seguidos e difundidos pelo mundo todo agora, passa pela compreensão de que cada lugar tem seu lugar na história. Não é muito sadio, ultimamente, querer impor estereótipos da cultura americana ou de qualquer outra, sem nenhuma identificação com a sociedade e cultura dos países onde atuam.


A mesma reportagem do Portal Exame de maio de 2008, credita a Robert Iger (que assumiu a presidência da Disney em 2005) a responsabilidade pela readequação da marca. Sob sua liderança, a Disney ultrapassou as fronteiras do público infantil e avançou sobre a pré-adolescência. Boa parte do novo impulso criativo da Disney se deve a uma injeção do mesmo tipo de cultura que transformou a Apple em uma usina de inovação.


Em 2006, a Disney comprou a Pixar, estúdio de animação criado por Steve Jobs (fundador da Apple). Neste caso, a cultura da empresa comprada se infiltrou e se sobrepôs à cultura da compradora. Tanto que a Pixar é hoje a maior referência em animação digital, seja em excelência técnica, seja em criatividade. John Lasseter, vice-presidente executivo da Pixar, considerado a maior força inspiradora por trás das produções do estúdio, assumiu o cargo de executivo-chefe para a área de criação de toda a divisão de animação do conglomerado Disney e passou a acumular o posto de conselheiro criativo da Disney Imagineering, empresa que projeta as atrações dos parques temáticos da Disney.


Neste tempo de mudanças, parques que estavam em precário estado de conservação (como a Disneylândia, no estado da Califórnia) e eram alvos de protestos pela Internet, fazendo feridas na imagem da Disney, ganharam brinquedos inspirados em filmes da Pixar como Toy Story e Procurando Nemo, grandes sucessos do cinema.


Mas chegamos em novembro de 2009 e muitas coisas parece que estão em constante mudança nas empresas Disney. Notícia do New York Times dá conta de que Mickey Mouse, criado por Walt Disney várias décadas atrás, e que rende cerca de 5 bilhões de dólares à empresa, deve mudar de personalidade. A máxima de que em time que está ganhando não se mexe pode estar com os dias contados.


Mas a personalidade dos personagens Disney que sempre deram o tom para a imagem da marca não está mais agradando?


Os 5 bilhões de dólares auferidos com o velho ratinho não são suficientes?


Parece mesmo que não. O primeiro passo nesta mudança poderá ser visto no jogo Epic Mickey, que será lançado no ano que vem. Ali, o personagem vai mostrar seus momentos de mau humor e outros em que banca o espertalhão. Uma imagem bem diferente daquela que acalentou sonhos e povoou o imaginário de muitas crianças desde que foi criado.


A repercussão do jogo vai determinar o futuro do personagem. Se ele for bem recebido, a Disney pretende mudar desde o conceito da linha de produtos do Mickey até a exposição que o ratinho tem nos parques temáticos espalhados pelo mundo.


Será uma adaptação sociológica onde a violência parece estar sendo mais cultuada que o bom comportamento?


E como fica a imagem das empresas Disney?


Lógico que temos os personagens nada éticos que circundavam as histórias do grande herói Mickey Mouse, mas levar este herói para o outro lado não poderá ser um grande tiro no pé para as empresas Disney?


Num momento em que muitos se esforçam para manter uma imagem de boa reputação diante do público consumidor através de um comportamento responsável diante da sociedade, o que pode acontecer com a imagem de um modelo de entretenimento com o qual os pais sempre fizeram questão de premiar as notas boas dos filhos?


Pode parecer uma mudança insignificante em termos de adequação do produto ao mercado, mas vai exigir um grande monitoramento por parte da Disney, que possa detectar quaisquer reações adversas no seu ticket médio de visitas aos parques temáticos.


A imagem da Disney, queiram ou não, está extremamente ligada a imagem dos seus principais personagens dos quais o Mickey Mouse é o grande carro chefe. Afinal, não é ele quem abre os desfiles dos parques, recebendo os visitantes com todo o carisma que conquistou ao longo de todos estes anos?


Fonte:


http://portalexame.abril.com.br/blogs/cristianecorrea/listar2.shtml http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0918/marketing/m0159327.html

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